Leio, aqui no 19 Virtual, um bilhetinho de despedida do Paulinho e da Adriana. Encerraram as atividades da Joalheria Genz. Cederam o ponto e agora a ótica mudou de nome e direção.
A leitura me emocionou. A presença da loja, no centro da cidade, foi para mim como um esteio. Ponto de identificação. Aqui é Encruzilhada. Entrar e ver as antigas vitrines, perfeitamente conservadas, cheias de óculos, relógios, jóias, um conforto para os olhos. Seu Paulo, o relojoeiro, na mesinha do canto, com aqueles óculos esquisitos, focando mecanismos microscópicos, sempre me agradava.
A Encruzilhada mais antiga, da qual ainda tive a sorte de viver uma parte, era lenta. Em todo o lugar que se ia, havia alguém para conversar, contar um causo, gastar o tempo. Trocar a pulseira de um relógio, tarefa para não mais de cinco minutos, muitas vezes consumia uma hora. Cinco minutos na pulseira, o resto ali, conversando. E era bom isso.
Então, olhando com olhos da memória, me ocorreram indagações. Brotaram da constatação de que a ótica foi única na cidade por muito tempo. Quanto tempo? Quantos óculos saíram dali, clareando as vistas dos cidadãos? Ou diminuindo a força da luz do sol, ou mesmo enfeitando os rostos trigueiros que passeavam nas ruas?
Fui lá, perguntei para a Adriana. Foram únicos por mais de trinta anos, e compartilharam freguesia por mais outros trinta e tantos. Metódicos, organizados, num livro de memória registraram 141.006 óculos vendidos. Isso aí, cento e quarenta e um mil e seis óculos! Pais, filhos, netos e bisnetos foram servidos, em quase todas as casas da cidade.
Dos óculos, é fácil seguir para os relógios. Desde o tempo da corda, do automático até os eletrônicos. Quantas bombas de prata, hein, e os anéis, pulseiras, alianças. Quantos noivados, casamentos, 15 anos, perdões enfim, passaram pela Genz.
Tudo que nasce, morre, tudo que começa, termina. Lojas também. Tantas vão e vem, muitas grandiosas, multinacionais quase. Mas algumas são mais que lojas, são parte da comunidade, quase uma pessoa da família. E por isso serão sempre lembradas.
