Para todos nós, que estamos nas voltas dos sessenta anos, um sininho começou a tocar. O nome do meu é “urgência”. A cada dia que passa, aumenta a consciência de que a vida vai terminar. Existe, é claro, a chance de eu ser o primeiro, senão único, ser vivo eterno. Mas reconheço ser uma possibilidade bem remota.
Então, a urgência está associada ao sentimento de felicidade. A felicidade de estar vivo. Presenciando as maravilhas do mundo, fazendo as coisas que gosto. E as que não gosto também. Afinal, bem e mal, alegria e tristeza, são temperos, como açúcar e sal.
Agora, pensemos. O mundo tem 14 bilhões de anos. Significa 230 milhões de vezes o tempo em que estou vivo. Dos quais tenho uma certa memória, afinal a história serve para isso. Contar para mim o que aconteceu antes de mim. E são números mensuráveis, palpáveis, embora enormes. Pior, muito pior, é o futuro. Daqui uns ou muitos anos, eu já não estarei vivo. E aí, quanto tempo o mundo vai durar dali para a frente. E desse futuro, nada. Nunca saberei nada. Se o mundo terminar um segundo depois de mim, não fará diferença nenhuma. Não tem nenhuma possibilidade de eu saber.
A não ser que haja outras vidas, ou um paraíso celestial. Mas, e agora. Quem vai saber?
O jeito, a solução, é viver. Tem um senhor lá em Pelotas, no mercado público, onde fui uma vez cortar meu cabelo. Setenta e cinco anos de barbearia, ele me contou. Segundo ele, “tem que existir o paraíso, porque senão os bandidos é que têm razão”. Talvez, da maneira que ele pense, é preciso controlar-se para chegar ao céu. Penso um pouco diferente, é preciso controlar-se para permanecer vivo, e saudável.
Chegar na melhor idade deve ser isso, administrar a urgência para permanecer vivendo. Penso que essa urgência seja parte da energia da vida. “eu quero”, “eu desejo”, “eu posso”.
Tenho conversado com gente, em diversas fases da vida. Acho que existem fases. Empreendedores, acomodados, gananciosos, por aí afora. Quase todos, em algum momento, dizem a famosa frase “acho que tenho que diminuir o ritmo, afinal ninguém leva nada da vida”. Poucos fazem o que dizem. Mas aí é que eu acho que está o xis da questão. Quanto eu realmente preciso? Quão bem me faz trabalhar? Juntar? O que eu realmente procuro?
É muita coisa para pensar. Enquanto isso, o relógio vai tiquetaqueando rumo ao futuro. Lá, não existe história.