Por Sérgio Schroeder
Até onde sei, chimarrão quer dizer xucro, clandestino, selvagem. A primeira vez que ouvi essa designação foi para definir os animais bovinos que ficaram perdidos pela província, depois da queda das Missões Jesuíticas. Durante muitos anos andaram sozinhos pelo território e tornaram-se selvagens, novamente. Ainda hoje existe uma raça, que por vezes é apresentada na Expointer, e tem criadores acho que em Vacaria, e que conserva essa raiz chimarrã. Não são bovinos muito grandes, nem tem os quartos tão desenvolvidos como as tradicionais raças de carne. Além disso, possuem como característica chifres muito grandes.
Por falar nisso, Vacaria, o nome, vem das vacarias. No tempo das missões, o território todo era como uma grande estância. E na região do alto do planalto era onde ficavam as vacas. Por isso a região se chamou Vacarias. Os bois eram engordados mais ao sul, na região da fronteira com o Uruguai, onde estavam os campos mais finos.
Os índios tomavam mate. Foi deles que aprendemos o hábito. Mas não usavam bombas como usamos hoje. Eles usavam o tacuapi, um tipo de canudo de taquara, que inseriam na cuia para tomar o mate. Provavelmente bebiam frio, porque sabemos que os índios não deveriam ter chaleiras para esquentar a água. Bem lembrado, tacuapi, cuia, taquara, porongo, mate, são nomes indígenas. Chaleira já é ibérico, donde vieram os colonizadores. Chimarrão já é uma mistura, porque parece que vem de marron, que é ibérico, e que parece significar, entre outras coisas, clandestino. Já o ci é um termo indígena. Do que sei, çi quer dizer mãe, em guarani. Mas não sei como isso se encaixa no chimarrão, apenas sei que a origem é cimarron.
Na prática, chimarrão, capim, gado criado a pasto, definem os gaúchos. Cavalo também. Parece que o Rio Grande hoje tem algo como 500 mil cavalos. E dizem que se tivesse essa quantidade de cavalos no tempo da Revolução Farroupilha, talvez até o Brasil hoje se chamasse Piratini.
Tanto cavalo e quase não se usa mais a montaria. Os campos ficaram pequenos, inventaram confinamento para o gado, motos e quadriciclos campereiam mais rápido. Até o churrasco está mudando, e inventaram churrascarias veganas, cuja finalidade não consigo compreender. O chimarrão, por causa do coronavirus, ficou mais egoísta. Só se divide a cuia com quem é muito de perto, e de quem se tem muita certeza.
Tempos que mudaram, tradições que se adaptam. Mas a terra é a mesma. E é bem boa.