CISMAS l Eram outros tempos…

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        A história que repasso a vocês logo abaixo e, que dias desses estava lendo, me remeteu a outros tempos que, não tive o privilégio de viver.

        Digo outros tempos porque lá havia ideologias, pessoas sérias e “apalavreadas”, ou seja, honravam o fio de bigode em suas declarações e promessas, pessoas com senso comum, bem diferente dos dias de hoje.

        E, seus eleitores confiavam por demais em seus políticos escolhidos, defendendo-os na certeza de que estava ali o seu verdadeiro representante, ainda mais que nunca os decepcionavam.

        A história contada vale como um reflexão.

        A única pergunta que nos resta fazer é: onde foi que o trem descarrilou? 

O Barqueiro e o Chefe

 

No século XIX, no interior do Rio Grande do Sul, um humilde barqueiro conduzia passageiros na travessia de Santa Maria a São Gabriel, utilizando o Rio Vacacaí.

Ele nutria especial admiração e apreço por uma importante figura política gaúcha.

Ninguém podia pronunciar opiniões desfavoráveis ao seu “herói” sem que isso produzisse reações destemperadas no espírito daquele barqueiro.

Em uma ocasião, um de seus passageiros, durante a travessia, lhe contou um segredo ao pé do ouvido:

Nos próximos dias, o Conselheiro Silveira Martins visitará São Gabriel, fazendo a travessia do Rio Vacacaí a partir de Santa Maria.

O barqueiro chegou a perder o sono com essa notícia. “E se for eu a transportá-lo na travessia? O que eu lhe direi? Não, isso deve ser uma brincadeira para comigo. Todos aqui sabem que eu o admiro como meu chefe político”.

Eis que, em uma dada manhã, subiu em sua balsa um homem corpulento, com voz de trovão, trajando um belo poncho. O barqueiro lhe indagou se ele não seria o Coronel Prates, ao que ele negou.

E assim foram conversando, até quando o barqueiro lhe confessou que acreditava que naquela semana iria transportar seu chefe, e deslanchou a elogiar aquela personalidade, que para ele era ainda mais importante que o próprio Imperador, por ser, em sua opinião, o maior representante do povo gaúcho.

A viagem estava chegando ao fim e o passageiro pergunta:

– Quem é esse teu chefe?

– Ora, quem “havera” de ser? Nosso Gaspar Silveira Martins.

Então, quase pisando na outra margem, o passageiro, puxando do bolso uma generosa quantia, entregou-a ao barqueiro, que, surpreso, quis saber com quem viajara. Sorrindo, o passageiro respondeu:

– Viajaste com Gaspar Silveira Martins.

– Sendo assim, não posso receber! Foi uma honra.

– Aceite! É uma ordem do teu chefe.

Ambos se abraçaram e o barqueiro, com a voz embargada e os olhos marejados, respondeu:

– És um grande chefe!

O tribuno seguiu seu trajeto e o barqueiro prosseguiu em sua rotina. Ambos jamais se esqueceram daquele encontro.

 

Referência:

 

Orico, O. “Silveira Martins e sua época”. Editora Globo. Porto Alegre, 1935.